fevereiro 26, 2005

Longe da alegria

Ruído ensurdecedor
De um silêncio destruído
Pelas mãos daquele cuja vida
Não se guia por uma melodia

Longe de ti eu procurei vida
Longe de mim eu me encontrei perdida
Longe da terra esquecida
Longe da terra de fantasia

O Luar reflectido no rio
Cujo brilho se confunde com as estrelas
Em que a esperança solitária
Chora as lágrimas da noite

Som da chuva;
Frio de um Inverno cinzento
Que com sua agonia e tormento
Lamenta a luz do dia

Sozinha lá estou...
Essência sem brilho
Num corpo deambulante
Sem lugar na realidade

Sem forças luto
Talvez por um regresso à vida
Em que tudo era belo
E tudo era inocente

Infância perdida
Nas cavernas da tristeza
Perdida na procura
Da presença da incerteza...

fevereiro 22, 2005

Sentido único

Cortam a minha vida
como se fosse um azedo limão
procurando que eu seja
bode expiatório
das quezílias mesquinhas
que sofrem a mãos de outrem.

Tentam manchar a pouca luz
que entra ainda na minha alma
como se fosse crime desperdiçá-la
em quem tenta ainda sobreviver.

Afiam as garras na minha pele
quase como se eu fosse de pedra
para poderem melhores golpes desferir
na minha carne ensanguentada.

Ainda não vos disse quem sou
e já me dizem quem sou;
ainda não pronunciei palavra
e parece que discursei
algo da minha lavra.
A carta em branco e não endossada
já foi por vós
aparentemente fechada e lacrada.

Apresentam-me o meu destino
como caminho inevitável
e esperam que o siga
com fé inabalável
nas tortuosas concepções
de normalidade e ilusões
com as quais se alimentam
- o veneno que vos corre nas veias.

Voltar ao estado
da mais pura inocência
seria para mim
maior traição
que a indolência insana
que é agora minha prisão.

Matem-me...
Ou tentem.
Quem consegue matar
quem morreu já
às mãos de iguais algozes
com iguais perícias ferozes?

A minha vingança,
não a vêem vós;
outros de outra luz a verão
e compreenderão
que não há salvação
na rejeição
da humana Razão
casada com o nobre coração.
Vós sois o meu estrume,
a nojenta substância
que faz crescer na noite
uma nova instância
de pensamento e fortitude.
I shall feast upon thee,
cruel executioners!

["I still remember the world
From the eyes of a child
Slowly those feelings
Were clouded by what I know now"
- Field of Innocence, Evanescence
... e a verdade é que não há retorno.]

fevereiro 20, 2005

A minha realidade

Quero chorar
Mas chorar já não consigo
Quero gritar
Mas meus gritos jamais serão ouvidos
Até aquilo que chamo inspiração
Parece fugir-me da mão.

Quero-me libertar
Mas fugir não consigo
Quero falar
Mas ninguém escuta o que digo..
E o meu frio coração
Chora sem emoção.

Traí eu a vida?
Porque a sinto eu corrompida?
Até este mundo inanimado
Me parece um teatro sofisticado
Onde a mentira
Mantém a tristeza colorida.

O calor não me aquece
O frio não me arrefece
Mas a dor...
Com todo o seu poder
De me fazer arder
Me minimiza ao horror.

Os caminhos a percorrer
Já não os consigo ver
E continuo a deambular
Sem ninguém para me guiar
Nem sequer para me aliviar
Do nada que me está a atormentar.

Quero tudo partir
Quero minha vida destruir
Quero voltar a sorrir
Com a verdade merecida
Nesta luta sofrida
Na realidade mentida.

Que fiz eu...
Para te ver chorar?
Que fiz eu...
Para agora te amar?
Que fiz eu...
Para minh’alma se despedaçar?

A colorida infância
Não passa de uma lembrança
De tempos idos
E agora sofridos
Em que o desejo de salvação
É abafado pela doce solidão.

A luz
Não me seduz
Mas a Lua...
Ter-me-á sempre sua...
A eterna amante
Da tristeza deambulante.

O meu mundo de fantasia
Que alegre me mantinha
Já não satisfaz meu ser...
Pois continuo a arder
Por detrás desta máscara
Que cada dia faço minha

Aquilo que procuro
Perdeu-se no escuro
E a melodia tocada docemente
Diluíu-se na obscuridade
No momento em que a vida
Para o silêncio caminha...

fevereiro 19, 2005

Nota de Edição

O "De Pena em Riste" deseja as boas-vindas a mais um autor: a poetisa Sianna junta-se agora a nós, sendo que brevemente será publicado um poema seu.

Entretanto, relembramos que apreciamos o maior número de comentários dos nossos leitores. Obrigado.

Kurotenshi e Prometeu

fevereiro 15, 2005

Evanescência

Cadentes estrelas
que ditam sortes
e verdades perenes
que alma alguma concebe.
Irados astros
que riscam o firmamento
e morrem num tormento
de calor e chamas.

Retrocede e olha
para as obras que semeaste;
se o vento as não levou
verás que não reconhecem
que as criaste.
Fortaleces a tua projecção
com a menção
a projectos, ideias e nomes
que mais tarde serão
conceitos anónimos
conhecidos por si mesmos sem ti.

Deixas uma pegada na areia
que se desvanece por razões mil:
sopra o vento e tomba a onda
e logo se apaga a marca
de que estiveste ali.

Existências diluídas
por Chronos destruídas
são o que resta
da pútrida aliança
que a carne faz com a Vida
no breve instante
de (in)sanidade errante
que tão carinhosamente prezamos.

fevereiro 13, 2005

Nota de Edição

Acompanhando os novos desenvolvimentos do Blogger, os comentários agora funcionam em sistema de janela pop-up, tornando-se assim mais fácil comentar e dispensando de todo qualquer inscrição no site (situação que já anteriormente não era necessária). Esperamos que isto sirva para aumentar o número de comentários efectuados, sendo que os agradecemos, desde que construtivos e organizados.

Obrigado.

Kurotenshi e Prometeu.

fevereiro 08, 2005

Falhar

Tentaste.
Eu sei que tentaste.
Esgravataste
o solo ao meu redor
tentando arracar-me do torpor
em que me tinham lançado
ao me porem de lado,
quase que arquivado
em poeirenta
arrecadação da memória.

Falhaste.
Ao tentares alcançar minha mão
não conseguiste enviar
suficiente emoção
para me fazer crer
no verbo "amar".

Conquistaste tudo.
Ganhaste a todos
em beleza e poder,
triunfaste sobre anátemas sem fim
mas não conseguiste tocar
a criatura em negro tecido enrolada
que sempre malfadada
suspirava pela última morada.

O meu último suspiro
ficará para sempre na tua mente
e será a sombra demente
do teu adormecer;
crerás que conspiro
para além do mundo vivo,
em tentativa de te endoidecer.
Mas não...
Foste tu que falhaste
mas também eu estava longe,
para além da compreensão
e nem tua luz fulgurante
conseguiu romper a prisão
da minha alma errante
em eterna punição.

fevereiro 03, 2005

A luz que não brilha

Sinto tuas mãos
a esgravatar no silêncio
conspurcado da minha alma
que em vão tenta silenciar-te.

Uivo ao luar
para me fazer notar
como monstro facínora
que devorará quem se aproximar,
qual amante da carnificina.

Põe tuas mãos sedosas em mim,
tenta amansar a besta;
morder-te-ei os dedos,
assombrarei a vida dos teus
e terás em conta que a traição
de em quem se confia
é mais sangrenta
que aquela que se atenta
contra desconhecida sombra lenta.

Sopras as tuas palavras
tentando acalmar minha alma,
esquecendo quem sou,
que todas as palavras me magoam
e que só o silêncio
- suspensão voluntária
da humanidade em mim precária -
consegue acalmar o fel
que escorre da minha boca
ruminado pelo maldito
e vomitado para o infinito.

Fere-me com as tuas carícias!
Recusa-te a perceber quem sou!
Mostra-me a tua compreensão!
Quem aos danados mostra salvação
não tem resposta que não seja o ódio
da vida que jamais alcançarão.